Jornal A Tarde · Salvador - Bahia - 24nov09 - por Chico Castro Jr.
Às vezes, um período longe dos holofotes pode até fazer bem para o artista – para se reciclar e até gerar saudade. Parece que foi isso que aconteceu com Belô Velloso, a sobrinha mais famosa de Caetano, filha de Mabel.
Versão Brasileira, seu novo álbum de canções inéditas – depois de oito anos – ainda nem saiu em CD, só em áudio digital. Lançado com exclusividade pela loja do portal Uol, figura há nada menos que cinco semanas consecutivas em primeiro lugar entre os mais vendidos – e há três no Top 10 de artistas do site.
E não para por aí: as faixas Mangueira e Back to Black (sua versão brasileira para o hit da célebre Amy Winehouse) também não saem do Top 10 de singles.
O resultado surpreendeu a própria Belô: "Isso para mim é surreal", admirou-se a cantora ao telefone. "Por que ali (no Top 10) está o grupo dos grandes. Na lista onde tem Beyoncè, Lady Gaga e Mariah Carey, é muito bacana ver uma artista nacional competindo", observa.
E Belô fica satisfeita não apenas porque é o disco dela que está vendendo bem, mas também por conta da própria evolução do mercado de música digital.
MPB em MP3
"Graças a Deus, o disco está tendo uma receptividade super bacana, sobretudo por que ainda não saiu o CD físico. É muito bom ver que o disco digital está tendo essa boa recepção, pelo carinho do público e pela própria facilidade de você poder comprar apenas uma canção. Sempre acreditei muito no áudio digital", diz.
Para ela, seu sucesso de vendas neste formato derruba inclusive o mito de que o MP3 está ligado apenas ao universo pop e ao público jovem: "Isso significa que o público brasileiro está consumindo a MPB nesse formato. Cai o mito de que o áudio digital está ligado apenas ao pop rock, por que meu trabalho atual é muito brasileiro", acredita.
"Me surpreendi, claro. Mas também fiz o disco para ser bem recebido, mesmo. Fiz commuito amor, carinho, dedicação. Como um retrato dessa artista mais vivida e mais madura, uma obra que preenchesse essa lacuna de oito anos sem um disco de músicas inéditas", acrescenta.
Calazans e a polirritmia
Produzido pelo baixista baiano Luciano Calazans, um virtuoso em seu instrumento e pesquisador incansável dos ritmos brasileiros, Versão Brasileira traz uma extensa variedade de estilos tipicamente baianos, como samba-reggae, afoxé, ijexá e samba de roda, entre outros.
Até aí, nada demais. O lance é que, juntos, Luciano e Belô costuraram – muitas vezes em uma só canção – esses ritmos baianos com outros mais identificados com o Rio de Janeiro, como bossa nova, gafieira e samba-enredo, causando um efeito rítmico caleidóscópico. Um triângulo imaginário, ligando Salvador, Santo Amaro e o Rio de Janeiro.
O trabalho em estúdio foi tão elaborado – ainda que o resultado nas caixas de som seja perfeitamente acessível a qualquer ouvido – que, no site oficial da cantora, há uma seção inteira só para explicar como se deu essa alquimia sonora, convenientemente intitulada A polirritmia de Luciano Calazans.
Um bom exemplo dessa polirritmia é a faixa Povo de Fé, que agrega de forma harmoniosa elementos de ijexá, samba-de-roda, samba enredo e maxixe. Um trabalho que, certemante, exigiu criatividade e muito suor dos músicos.
Versão Brasileira, porém, não é um disco que, no sentido temático, traga qualquer novidade, orbitando sempre numa brasilidade que, por mais sincera que possa ser – e quanto a isso, não há dúvida –, traz um certo esgotamento lírico ao se concentrar nas homenagens às belezas naturais culturais do Recôncavo, de Salvador e do Rio.
Portanto, não é de forma alguma um disco recomendado aos cínicos – visto que sua visão romântica nada mais é do que uma lembrança nostálgica de um Brasil que a modernidade inexorável deglutiu há tempos.
Com contraponto, o álbum traz como faixa-bônus o hit Back to Black em uma boa versão bossa nova. Segundo Belô, trata-se de um prenúncio do que vem por aí no próximo álbum, já em 2010.
VERSÃO BRASILEIRA - BELÔ VELLOSO
BMGV | TRATORE / R$ 13,93 /
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